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Terceira via. Tem isso mesmo?

João Amoêdo desistiu de ser candidato a presidente. Será mesmo? Eu tenho dúvida, porque sem a candidatura dele o partido Novo terá dificuldade para eleger deputados federais em número suficiente à garantia de sobrevivência do projeto do partido de ser relevante na Câmara dos Deputados. 

A campanha está desenhada com dois candidatos em pólos opostos, Jair Bolsonaro e Lula. Os institutos de pesquisa e imprensa apontam  uma terceira candidatura para alívio dos eleitores de nenhum dos dois. Falam em polarização como se ela fosse uma novidade e numa terceira via como se houvesse provas de possibilidade. É nesse contexto que enquadraram a candidatura do João Amoêdo. 

A polarização sempre esteve nas eleições para a presidência e a valer os percentuais apresentados para 2022, quem surgir no cenário só será viável se, e somente se, tirar eleitores de um dos dois em número suficiente para substituir integralmente um dos pólos. Tirar dos dois, em conjunto, é improvável, porque os perfis são radicalmente diferentes. Os eleitores de um odeiam os eleitores do outro a ponto de se separarem de velhos amigos, de gente da família e até de evitarem a eternidade no mesmo lugar. 

A polarização é uma velha companheira das eleições no Brasil, principalmente das presidenciais. Mas, fala-se nela como se fosse uma novidade! Da mais antiga à mais recente, todas foram resultado de polarização raivosa. Para não tornar o artigo maçante, fiz o corte em 1989, primeira eleição direta após o arranca-rabo entre Jânio Quadros e Henrique Teixeira Lott, tendo sido, Adhemar de Barros, a busca de uma terceira via. 

Em 1989, quem diria, que Fernando Collor chegaria à presidência? Por que chegou? Por ter polarizado a campanha com Lula e pelo fato de Brizola ter se inserido para ser uma terceira opção. Dividiu o primeiro turno com Lula, mas não com peso suficiente para evitá-lo no segundo turno. 

Depois tivemos 1994 e nova polarização, naquele ano entre Fernando Henrique e Lula, uma campanha radicalizada e acirrada a ponto de fazer com que Lula e o PT votassem contra o Plano Real, por ser a bandeira do adversário. Naquela eleição Lula só venceu no Rio Grande do Sul. Em 1998 Ciro Gomes tentou polarizar com FHC para tomar o lugar do Lula, Eita! Nem isso é novidade! FHC venceu no primeiro turno, ainda com a bandeira do Real. 

Em 2002, Lula finalmente chegou lá, numa campanha polarizada entre ele e José Serra e não entre ele e FHC. O presidente Fernando Henrique ajudou Lula de uma maneira tal que José Serra, candidato do seu partido, só venceu em Alagoas. Garotinho tentou tirar Lula do páreo, mas não conseguiu substituí-lo integralmente. Só evitou que a eleição do Lula ocorresse no primeiro turno. 

Tivemos nova polarização em 2006, entre Lula e Alckmin, porque José Serra, do seu partido,  resolveu fazer corpo mole, para não disputar com Lula e evitar que Alckmin, sendo presidente, disputasse a reeleição em 2010. José Serra, abandonado pelo FHC em 2002, jogou Alckmin às feras em 2006. 

Chegamos a 2010, quando José Serra apresentou-se para derrotar a guerrilheira Dilma Rousseff. Pule de dez! Marina Silva quis ser a terceira via, para tirar Dilma do jogo, mas mordeu os votos do José Serra, que quase perdeu no primeiro turno, com o corpo mole do Aécio Neves, companheiro de partido, ferido e humilhado por Serra na pré-campanha. 

Em 2014, Eduardo Campos quis ser a terceira via para substituir Dilma Rousseff. Faleceu. Marina Silva entrou no jogo e escolados, os dois outros candidatos, Dilma e Aécio, resolveram empurrá-la para fora do campo. Marina não entendeu o processo, defendeu-se como pôde dos dois e não de um só e ficou barrada no primeiro turno. No segundo, tentou resolver indo para o pólo do Aécio. Era tarde.

Em 2018, foi Bolsonaro num pólo e o PT no outro. Quem tentou se enfiar no meio, ficou pelo caminho. Só teria chance quem substituísse um dos dois. 

Está claro, portanto, que não há essa história de terceira via, em campanhas polarizadas entre dois candidatos, como está mais do que evidente, que as campanhas tendem sempre à polarização. O terceiro candidato, para se viabilizar e vencer precisa substituir um dos outros na preferência do eleitor. É desse modo que vejo a candidatura do João Amoêdo. 

Para ser viável, Amoêdo precisa ter os votos arrependidos de Bolsonaro e, para vencer, substituir o capitão na preferência de grande parte dos demais. Caso contrário, Amoêdo só reduzirá as possibilidades de Jair Bolsonaro ser reeleito. No hemisfério do Lula ocorrerá o mesmo se Ciro roubar a cena. Portanto, a polarização seguirá e haverá equilíbrio entre as forças. 

Jefferson Viana publicou aqui um artigo interessante: “Vida e Morte da Terceira Via”. Em um trecho, ele nos presenteou com uma frase do liberal Roberto Campo, que me dá uma mãozinha aqui: “A chamada terceira via é incompetência para praticar o capitalismo e covardia para aplicar o socialismo”. Jefferson complementa: “Na política posicionamento se faz necessário, pois na tentativa de agradar a todos não agrada ninguém…”.

Ora, se Lula e Bolsonaro têm o tamanho eleitoral que lhes determinam as pesquisas, a vida dos demais candidatos será bem difícil. Todos funcionarão na linha de levar a disputa para uma posição mais equilibrada entre os dois principais ou para desequilibrar a balança na direção de um deles. Poderá ser diferente? Ah! Sim. Poderá, porque o eleitor é o “senhor da razão” e só decide no momento mais próximo do dia da eleição. E se decidir diferente, será uma grande novidade. 

Candidato de centro numa eleição polarizada? Não há precedentes. Quem insistir nesse caminho terá o destino da Igreja de Laodicéia: “Tomara que foras fria ou quente! Porque és morna, vomitar-te-ei da minha boca” (Apocalipse 3:16). Se Ciro ou Amoêdo quiserem ter chances de vitória terão que substituir Lula e Bolsonaro na disputa. E isso, até aqui, vale para qualquer outro candidato a presidente. 

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Lula solto. Bolsonaro livre?

Meu compromisso seria retomar a rota iniciada no artigo da semana passada, quando tratei da relação da imprensa com a política e firmei a minha opinião sobre o papel dos jornalistas como agentes políticos, que não conseguem, ainda que queiram, agir com isenção.

Contudo, preciso mudar o rumo da conversa, porque Lula voltou às ruas com base numa decisão do Supremo Tribunal Federal, fato que desejo comentar sob a ótica da imagem e dos conceitos da estratégia, ferramenta que avalia oportunidades, ameaças, pontos fortes e frágeis e cria mecanismos para que se conservem as conquistas.

O STF saiu com a imagem arranhada? Muito, apesar dos ministros, terem dado, no passado, uma no cravo e agora, outra na ferradura. Somos uma nação rachada ao meio desde 2014. Então, era de se esperar que, ao agradarem uma parte do povo com a prisão em 2ª instância e a outra parte, agora, com uma sentença inversa, os ministros tivessem zerado o jogo. Não zeraram, porque com relação à imagem, os ministros, na verdade, abriram uma segunda cicatriz na face.

O Supremo Tribunal Federal é, por definição, o guardião da Constituição e ao decidir sobre a aplicação dela não deveria ter dúvida. E, certamente, não tem. As decisões que contrariam decisões anteriores têm outro motivo. A Corte, como a imprensa, é formada por homens e mulheres com histórias de vida, simpatias e antipatias próprias, que se comunicam numa linguagem também muito própria. Ela lhes permite dizer a mesma coisa de modos mil vezes diferentes e coisas diferentes de mil modos iguais. O Supremo tem, além desses, outro argumento para as decisões controversas: o legislador brasileiro faz leis com jeitinho.

Há algum mal nesse modo do Supremo se relacionar com as leis e com a população? Se há, ele vem do início da nossa história, tempo suficiente para a gente aceitar o fato como tradição e ter menos aborrecimentos. Os livros “Tanques e Togas” e “Os Onze, o STF, seus bastidores e suas crises” dão boa mostra de como os ministros da Corte são humanos comuns com vigor político. No capítulo que comenta as consequências da morte do Ministro Teori Zavascki, “Os Onze” registra uma declaração do ex-ministro Sepúlveda Pertence sobre o STF. Diz ele: “O Supremo é um arquipélago de onze ilhas incomunicáveis”.

Para mostrar que o modelo não é exclusivo do Brasil, o livro continua a definição com a declaração do juiz da Suprema Corte americana, Oliver Wendell Holmes sobre o tribunal dele: “Nove escorpiões numa garrafa”. “Tanques e Togas” e “Os Onze foram escritos pelo jornalista Felipe Recondo, o segundo em parceria com Luiz Weber, jornalista e mestre em Ciência Política.

Nesse contexto, alguns perguntam: “Onde estará a segurança jurídica?”. Está em sabermos que as leis e decisões judiciais, em nossa terra, funcionam ao sabor dos ventos da política.

Antes que termine meu espaço, pulemos algumas casas para chegar ao Lula nas ruas. É o caso de se perguntar: E agora, para onde irá a política? Irá, com mais velocidade, para os extremos, dando ao centro, o destino que Cristo deu à igreja em Laodicéia: “…Assim, porque és morno e nem és quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da minha boca” (Apocalipse 3:16).

E a batalha entre os extremos, quem vencerá? É cedo para saber, mas com Lula solto, Bolsonaro perde a liberdade para fazer o que anda a fazer por aí se quiser conquistar outro mandato. Mas, ele ganha a oportunidade de receber de volta os apoios que vem perdendo de antigos eleitores e aliados e tudo deveria fazer para conservá-los porque, na vida, não há insubstituíveis.

Para não termos o PT de volta ao poder, nós substituiremos Bolsonaro se ele não for a garantia que precisamos. Os liberais, certamente, têm bons personagens.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos